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O voto pela inconstitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil

Qual é a questão?

De: https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2024/12/05/mudar-o-marco-civil-da-internet-resolve-a-desinformacao-no-brasil-o-que-dizem-especialistas

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quinta-feira (5), o julgamento de ações relacionadas à responsabilidade civil das plataformas de redes sociais. Três casos, que dizem respeito a perfis falsos nas redes, ofensas pessoais e suspensão de serviços de mensagens podem colocar em xeque a constitucionalidade do artigo 19 da Lei nº 12.965/2014, o Marco Civil da Internet (MCI), que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil.

O artigo prevê que as empresas de redes sociais e aplicativos de mensageria só podem ser responsabilizadas civilmente por conteúdo veiculado nas plataformas se não adotarem medidas - exclusão de conteúdos, por exemplo - ordenadas pela Justiça. Ou seja, neste regime, conhecido como “ordem judicial e retirada”, as plataformas não podem ser diretamente responsabilizadas por publicações feitas por terceiros, ainda que hospedem, impulsionem ou lucrem com estes conteúdos.

Na prática, o cidadão que se sentir lesado por publicações nas redes pode ter que se submeter a um processo longo de judicialização caso peça a remoção de um conteúdo, enquanto publicações potencialmente nocivas continuam disponíveis na internet. Um dos casos agora julgados pelo STF teve início em 2010, quando uma professora pediu à rede social Orkut, hoje extinta, a exclusão de conteúdos ofensivos e misóginos dirigidos a ela. O Google (dono da antiga rede) se negou a excluir o conteúdo antes que houvesse decisão judicial, alegando que isto seria uma violação da liberdade de expressão.

Dez anos após a promulgação do Marco Civil da Internet, o modelo de negócio das plataformas evoluiu; as redes passaram a introduzir anúncios publicitários e recomendações baseadas em algoritmos, algo que não existia - ou era muito incipiente - até 2014. Para o ministro do STF Dias Toffoli, relator do caso sobre perfis falsos, existe uma percepção de que o artigo 19 protege conteúdos desinformativos e potencialmente nocivos.

Durante a retomada dos julgamentos, Toffoli sinalizou que votará pela inconstitucionalidade do artigo 19. “Podemos dizer que hoje nós vivemos um mundo de violência digital. E violência digital essa que o artigo 19 acoberta, enquanto não houver descumprimento de decisão judicial. Me desculpem, mas eu vou reiterar isso a todo o momento”, disse.

Sobre o Marco Civil da Internet

De: https://direitosnarede.org.br/2024/11/14/nota-sobre-constitucionalidade-do-art-19-do-mci/

O Marco Civil da Internet foi aprovado em 2014 e se tornou referência mundial de garantia de proteções e direitos humanos na rede mundial de computadores. Sancionado no dia 23 de abril, durante o Encontro Global Multissetorial sobre o Futuro da Governança da Internet (a NetMundial), a lei foi uma declaração do Brasil em defesa da democratização da governança global da Internet e por uma rede diversa, plural e aberta. Mais do que mérito do seu texto, a forma de construção e elaboração participativa do Marco Civil da Internet segue sendo um exemplo que o desenvolvimento da rede e sua regulação não pode prescindir do processo de discussão e participação da sociedade.

Não obstante, mudanças na internet com a crescente centralidade das plataformas digitais desafiam o Brasil a atualizar o entendimento do sistema de responsabilização, por exemplo considerando-a em casos de conteúdos promovidos através de pagamento de anúncios e monetizados pelas plataformas, e de avançar na garantia de medidas que enfrentem problemas como opacidade no funcionamento e garantia de devido processo em relação à moderação de conteúdos, por meio de uma legislação específica.

Agora que passou, o que mudará?

Determinação 1: O provedor de aplicações de internet será responsabilizado civilmente pelos danos decorrentes de conteúdos gerados por terceiros quando deixar de tomar providências cabíveis em tempo razoável após notificação do ofendido ou seu representante legal

  • Remoção facilitada de conteúdo sobre notificação (um retorno a meados de 2013)
  • Responsabilização das plataformas por não cooperação e
    não remoção de conteúdo

Determinação 2: O provedor de aplicação responde objetivamente e independentemente de notificação em casos em que recomende, impulsione ou modere conteúdo (ponto 3.1 do decálogo)

  • Conteúdo monetizado e impulsionado precisará de um cuidado muito maior por parte das redes sociais

Determinação 3: O provedor de aplicação responde objetivamente e independentemente de notificação quando se tratar de conta inautêntica (também denominada de ‘perfil falso´), ou de conta desidentificada e/ou automatizada (ponto 3.2 do decálogo)

  • Fica quase que criada a obrigação de uma identificação por meio dos 'provedores'

Determinação 4: Os provedores de aplicações de internet possuem o deveres anexos relacionados ao estabelecimento de regras claras, procedimentos padronizados para a moderação de conteúdos e disponibilização de canais específicos de comunicação (ponto 7, “d” e “h”, do decálogo)

  • Transparência de motivos de deleção e bloqueios
Explorando as problemáticas:

O pior dos cenários seria a votação pela inconstitucionalidade do artigo 19, porque ficaríamos desamparados. Ou seja, não vai fazer com que as empresas de plataformas digitais criem políticas novas.

Além disso, elas podem passar a moderar conteúdos sem cerimônia, como tirar conteúdos sem pedido judicial, por exemplo. E o Marco Civil da Internet tinha justamente o princípio de proteger o usuário.

Bruna Santos, gerente de campanhas global da Digital Action e membro da Coalizão Direitos na Rede

Da "Nota técnica sobre o julgamento do tema 987 de repercussão geral" do Instituto de Referência em Internet e Sociedade

A notificação do ofendido como elemento disparador da responsabilidade de provedores confere poderes excessivos e que podem ser manipulados de formas espúrias

Sobre a identificação de contas

Neste sentido, há questões técnicas e sociais envolvidas nos procedimentos de verificação de contas disponíveis hoje. A responsabilidade objetiva e independente de notificação para contas inverídicas tende a criar procedimentos opacos para a exclusão de contas, sem a garantia de devido processo.

Sobre a responsabilidade objetiva:

  1. A generalidade dos casos que ensejam responsabilidade objetiva inviabiliza a operação de diversos modelos de negócios
  2. A responsabilidade objetiva amplia o desconhecimento do usuário sobre o conteúdo moderado
Sérgio Amadeu explicou bem:

Relembrando a PL 2630/2023

  • Todas vezes que eu falei sobre isso e ouvi falar pela boca de especialistas, geralmente chegamos no ponto que o bom mesmo seria a gente buscar algo parecido com a PL 2630/2023

O melhor artigo sobre ainda é:

https://revistaopera.com.br/2023/05/05/o-pl-2630-e-bom-e-por-isso-tao-atacado/

  • As redes já são reguladas, mas são reguladas pelas empresas que as controlam, e tal regulação é de todo desconhecida para nós.
Qual seria o escopo dessa PL?
  • Redes Sociais
  • Buscadores
  • Serviços de Mensageria
  • Serviços de conteúdo por assinatura
  • Todos esses provedores de serviço com mais de 10 milhões de usuários
Os tipos penais:
  • crimes contra o estado democrático de direito
  • atos de terrorismo e preparatórios
  • crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio ou automutilação
  • crimes contra criança e adolescente previstos na Lei nº 8.069
  • crime de racismo
  • crime de violência contra a mulher
  • infração sanitária
Outras propostas interessantes:
  • Transparência sobre os parâmetros de recomendação e direcionamento de conteúdo ao usuário.
  • Publicidades devem ser identificadas juntamente com seus anunciantes. ... Histórico de anúncios e de perfilamento deve ficar disponível pro usuário por 6 meses.
  • Transparência sobre os motivos de bloqueio e deleção de postagens

O que é importante entender:

  • É basicamente consenso entre especialistas na área que o Marco Civil da Internet já não abarca todos os problemas que estamos enfrentando como decorrência dos novos modelos de negócio das redes sociais

    A derrubada do artigo 19 não resolveria [o problema da desinformação]. Outras coisas precisam ser feitas, mas ela faz parte do pacote de medidas necessário para amenizar o problema da desinformação. Por quê? Porque o artigo 19 está anacrônico.

    O artigo diz respeito à inimputabilidade de provedores de acesso. Mas ‘provedores de acesso’ eram as companhias telefônicas que, de fato, eram neutras, então não poderiam ser culpadas pelo o que circula na rede. As plataformas não são meros provedores de acesso. São outra coisa.

    Elas, na verdade, são mídias. Ganham dinheiro com publicidade, impulsionamento. Basicamente, elas interferem no fluxo de informação. Interferem no conteúdo, interferem no que as pessoas vão ter acesso. Então, não são mais neutras. É basicamente disso que se trata.

    Marco Schneider, pesquisador titular do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict) e presidente do International Center for Information Ethics

  • Ausente alguma regulamentação bem pensada e com ampla discussão da sociedade como foi o Marco Civil, abriu-se a brecha para que o STF decida sobre essas questões. Essa inércia é parte do plano das big techs

  • Big Techs, seus think tanks e os políticos da direita que são os seus defensores fiés querem nos fazer acreditar que é uma escolha entre:

    • Nenhuma regulamentação com uma internet livre
    • Regulamentações que vão criar censura e insegurança jurídica
  • Obviamente a resposta correta é legislar em prol do que é melhor para o país e não cair no papo do lobby das Big Techs. Nós já conseguimos fazer isso antes com o Marco Civil e temos que focar nisso agora.

  • A decisão do STF é no mínimo inócua em coibir os abusos das grandes redes sociais e no limite pode facilitar o abuso dessas regras pelo 'ofendido' que agora ganha muito mais poder nas reclamações

  • Seria esse um caminho para uma coalisão maior adotar a luta por uma boa PL como a 2630/2023 ou a direita vai continuar usando o STF como bode expiatório?

Referências:

https://irisbh.com.br/wp-content/uploads/2024/12/IRIS-Nota-Tecnica-sobre-o-julgamento-art.-19-STF.pdf

https://direitosnarede.org.br/2024/11/14/nota-sobre-constitucionalidade-do-art-19-do-mci/

https://www.intercept.com.br/2025/06/05/como-o-google-emplacou-manchetes-alarmistas-sobre-o-julgamento-do-marco-civil-da-internet-sem-sujar-as-maos/

https://www.msn.com/pt-br/noticias/brasil/folha-prevê-volta-da-censura-após-decisão-do-stf-sobre-o-artigo-19-do-marco-civil/ar-AA1GDXtp

https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2024/12/05/mudar-o-marco-civil-da-internet-resolve-a-desinformacao-no-brasil-o-que-dizem-especialistas

https://netlab.eco.ufrj.br/post/mudar-o-marco-civil-da-internet-resolve-a-desinformação-no-brasil-o-que-dizem-especialistas